20061120

Nas minhas andanças - MEDO

Medo, o que é medo?
Medo é pavor, também é receio. Assim se define o medo.
Mas hoje vou falar de um medo que não deveria existir em ninguém, nem mesmo em gente grande.
Aprendi que o medo na melhor idade é um medo diferente de todos os medos, tenho aprendido tanto ( infelizmente ) com a doença da minha mãe. O medo que as crianças sentem dos pais, quando fazem algo errado, é um medo quase sem medo, sabendo que tudo ficará bem depois.
E o medo quando se está com quase setenta anos ou mais, é um medo frágil, um medo ate mesmo de sentir esse medo.
Quando nossos filhos são bebezinhos, os tomamos nos braços, os protegemos com ternura...mas ficam adultos, muitas vezes sentimos medo deles, eu não nego, ate já senti medo do meu filho. Mas esse medo não é aquele que iria me ferir a carne, mas o medo de me ferir a alma. Hoje, lamento tanto saber que muitos filhos não tem paciência com seus pais idosos, e dizem coisas que lhe fere a alma, magoam, e esquecem que se fazem parte desse mundo, devem ser gratos à pessoa que o colocou aqui.
Minha mãe está sentindo medo de quase tudo, não quer mais ficar sozinha, teme tudo e quase todos. Ela me disse que tem medo dos medos que ela sente. Hoje, ela falando sobre a morte, dizendo para eu e minha irmã que, ainda bem que ninguém sente que vai morrer. Ela se referia ao que aconteceu no hospital semana passada, quando ela perdeu o sentido e deixou em pânico ate o medico dela.
Nunca vou entender que, de um momento para outro, sentimos medo dos filhos, temos que controlar o que falar, temos que ser comedidos alem do limite, temos pensar muito o que iremos dizer, para que nossos filhos não nos desaprovem e não nos ofendam. Temos que engolir uma dor profunda ao saber que muitos filhos não respeitam nossa dor, nem nossa limitação. Quando choramos, só queremos deles um abraço sem perguntas, sabendo que nenhuma lagrima é derramada sem motivos e ate mesmo carência. Repentinamente nossos filhos se tornam adultos, e nós não somos mais os seus protetores, eles não precisam mais da nossa proteção, creio que nem mesmo do antigo e mais puro amor. Outros amores surgem, e são mais importantes que os pais, somos substituídos, como se fosse possível substituir amor de mãe e de pai, mas para os filhos é possível sim. Amores esses que podem ser empregos, esportes, ou ate mesmo bens materiais. E ficamos com nosso amor aqui, sempre, igualmente grandioso. Também vem noras, genros e netos, mas esses são amores que se faz necessário na vida de todos.
Mas, quando somos nós que precisamos de cuidados, quando nossa vida é só fragilidade, quando esperamos mais e recebemos menos, o medo se instala sem pena e nem dó. Sabendo que todos protegem as crianças, mas nem todos protegem os idosos. Os filhos, raros os que protegem seus pais com o devido zelo, carinho e principalmente paciência. Tenho aprendido tanto ( infelizmente ) com a doença de minha mãe, ela está fragilizada em todos os sentidos, ela sente medo de tudo. Ela precisa de apoio para andar, precisa de apoio para servir seu prato, e principalmente de apoio moral. Ela chora facilmente, sente-se desprotegida, inútil por não conseguir fazer as coisas mais simples sozinha.
Minha mãe tem sorte, ela tem a mim e minha irmã, estamos sempre atentas para tudo. Eu do meu jeito, não deixando faltar as coisas, e minha irmã morando com ela, cuidado dia e noite. Sento com ela na sacada de sua casa, ela conta varias vezes a mesma historia, presto atenção como se fosse a primeira vez, faço as mesmas perguntas e ela me responde, assim, foi o jeito que encontrei de manter o diálogo e conversar sempre.
Minha mãe passou a vida inteira ajudando os outros, e na hora que mais precisa desses outros, ninguém pergunta se a luz foi paga, se água foi pago, se precisamos de alguma, e ainda assim, tem gente que não se toca e ainda doente a mãe continua ajudando pessoas. São pessoas que irão passar a vida inteira sugando e não serão gratos jamais. Muitos perguntam porque não sigo a missão de minha mãe, eu respondo que não aprendi lidar com ingratos, eu não sou ingrata, acho que as pessoas não deveriam ser. Caridade nessa vida tem limite, e quando ocorre o inverso, quando precisamos da caridade dos outros, somos esquecidos, ou então somos obrigados a vida inteira ser caridosos mesmo que não tenhamos mais nada para dar, nem saúde. Então, quando digo que temos que mudar nossos conceitos, para com tudo nessa vida não estou brincando não. Tem filhos que tem vergonha dos seus pais, coisa absurda isso. Tem filhos que por ter pais pobres tem vergonha, por ter um pai alcoólatra tem vergonha, por não ter recebido dos pais uma bela herança, tem vergonha. Mas a lei do retorno existe, e volta, como volta, e um dia sofrerão as conseqüências dos seus atos. Aí as pessoas se perguntam o que fizeram para sofrer tanto, seja no trabalho, seja onde for, é a mão de Deus cobrando seus pecados, mas mesmo assim não enxergam que, estão sofrendo a lei do retorno, e estão pagando as vezes um preço muito alto por atitudes tomada contra seus pais. Lamento tanto ver minha mãe sofrendo, amargo momentos profundamente triste e ela só pode contar comigo e com minha irmã perto...sempre perto!O que se passa no coração dos filhos que, não tem uma gota de amor em seu coração? O que faz eles terem tanta certeza que são superiores aos seus pais? O que lhe dá o direito da vergonha dos pais? Que direito tem de não ser delicados e principalmente quando estão doentes e precisando muito mais de amor e carinho? Melhor mesmo é não ter filhos, se for para magoar sempre, ferir, e nos fazer sentir vergonha de parido aquela coisa que, um dia chamamos de filhos, melhor não tê-los.
Conheço um filho que, mesmo tendo sua mãe muito doente, não tem respeito pelo sofrimento, é grosseiro, é ingrato, não tem paciência, não tem modos para falar com sua mãe, não sei o que faz ele pensar que, a presença dele seja importante para essa mãe, sabendo que quando ele sair da frente dela, ela se sentirá melhor, não sentirá medo dele. Grosseria nessa vida tem limite, indelicadeza tem limite, tudo na vida tem limite, menos para esse filho sem limite. Se ele soubesse que Deus está vendo a atitude, que pode ser a ultima vez que verá sua mãe viva...quem sabe ele teria um pouco mais de sensibilidade, compaixão e gratidão, e seria menos estúpido no jeito de falar com ela. Pagar contas dos pais quando eles precisam é normal, quando é possível para os filhos, mas os pais querem carinho, algo que vem de dentro de nós, que está acima de uma conta paga, algo que se chama simplesmente respeito e amor.
Incrível como os filhos não tem noção que, acima dos sessenta anos, ficamos mais limitados, eu com meus quase cinqüentas anos, já estou sentindo algumas limitações, e tem filhos que sugam até o último limite dos seus pais, e muitos com vergonha por ser sustentado por seus filhos, fazem o que não tem mais nem força, mas mesmo assim, fazem tudo para não desagradar quem poe o pão em sua mesa...mas esquecem que antes disso tudo, quem colocou o pão na boca, na mesa e na vida foram os pais.
Ai meu Deus, protejam todos nós, os pais, pois, muitos de nós seremos vitimas de algum filho ingrato, seremos vitima da violência, talvez não a violência corporal, mas a violência moral, onde os filhos ferem a integridade moral de seus pais. Apesar de tudo que já passei em minha vida, nesse momento só tenho olhos, ouvidos, braços e pernas para minha mãe e meu pai. São eles as pessoas que nesse momento mais precisam de mim em todos os sentidos, e farei minha parte com o coração alegre por eles estar vivos, e farei tudo para protege-los, só não o faria caso eu morresse agora.
Lindo ver um bebezinho nascer, ver seus dentinhos vir um a um, lindo os primeiros passos, lindo as primeiras palavras, tudo lindo...mas ficam tão feios, ficam monstros quanto ficam adultos e maltratam seus pais, são tão monstros quanto àqueles que sentiam medo quando pequenos.
Nas minhas andanças pela vida, tenho sofrido, chorando, mas tenho mais aprendido que ensinado, por isso, registro aqui no meu diário o medo que minha mãe tem sentido e tudo que está acontecendo com ela. São medos comuns quando se está muito doente, são medos normais quando ficamos fracos e sem forças, são medos, quem sabe, apenas medo, mas um medo sentido na alma.Vamos rever todos nossos conceitos, vamos rever a paciência que devemos ter com quem mais nos ama nesse mundo, vamos rever a gratidão por estarmos aqui, vamos rever sentimentos feios dentro da gente, vamos rever e mudar nossa postura, pois, é fácil adotar os pais dos outros, mas é muito difícil adotar nossos pais...não sei como pode, mas os pais dos outros são sempre mais legais, diria não adotar nossos pais, mas sim, nos tornar pais deles, pois, chega um momento na vida, que somos os pais de nossos pais, como bem diz minha amiga Elisete, quando chama sua mãe de "minha neném". Agora minha mãe se tornou a neném minha e da minha irmã...bem mais da minha irmã porque mora com eles. E não é fácil cuidar de neném pequeno e nem dos pais, mas compensa quando existe amor e ternura. Amo meus pais, jamais senti vergonha deles, tenho orgulho de andar ao lado do meu pai e da minha mãe. Adoro apresenta-los para as pessoas, dizendo que são meus pais. Queira Deus que permita, que eu, ainda possa andar por muitos anos ao lado dos meus pais, pois, não sei viver sem eles. Tão bom sentar na sacada da casa da minha mãe e ouvir as historias dela, tantas vezes repetidas e ouço como se fosse a primeira vez cada uma delas.
Não podemos esquecer jamais, que todo mal que fazemos para com nossos pais Deus está vendo, e todo nosso sofrimento, seja no trabalho, seja com nossos filhos, quem sabe, não seja para rever o que fizemos e o que estamos fazendo com nossos pais...vale rever e pensar bem, como foi que cuidamos dos nossos pais, sabendo que Deus está de olho nas nossas ações e atitudes. E para cada ato existe e lei do retorno.
São anos juntos, depois a vida se encarrega de colocar os filhos em seus lares, ou quem sabe permanecer sempre juntos, mas de tudo, de tudo mesmo, o amor e o respeito deve estar acima de qualquer coisa
Nas minhas andanças, deixo registrado que nada tem valor sem nossos pais, e sem te-los respeitado e amados como deve ser entre pais e filhos, nada mais vale a pena ser vivido.
Marillena
Em: 19 de novembro de 2006